quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Sobre inferno e verão, ou seria esse título redundante?


Verão chegando, maravilha: temperatura mínima na casa dos 30°C, sensação térmica na casa do inferno, sol a pino, cabelos grudentos, suor, suor alheio misturado ao seu suor, indisposição, cérebro derretendo, pele derretendo, idéias derretendo. Calor, calor, calor. Chuvas em todas as direções possíveis, imagináveis, inimagináveis.  Enchentes. Ônibus lotados, com gente passando calor e suando. Toda essa gente num ônibus lotado andando em meio à enchente.

Mais enchentes (eis mais uma das maravilhas de se morar na cidade com o segundo maior índice pluviométrico do Universo [?!], e que está caminhando para o primeiro).

Há quem diga que o verão é adorável, eu, peculiarmente ranzinza, sou obrigada a discordar. Talvez minhas experiências empíricas com a estação mais esperada (?) não tenham sido as melhores possíveis.

Ninguém disse que junto à pele pálida viria o incrível combo da incapacidade de sobreviver a míseros cinco minutos em contato com os raios solares. Ninguém avisou que aquela veia rompida no nariz, no calor do verão, desencadearia jorros de sangue de dar inveja a grandes filmes de terror.

Até a vaidade feminina vai embora ao verão – com exceções de algumas criaturas que vivem em função de mostrar os dotes físicos, independente de as temperaturas estarem positivas ou negativas. Maquiagem de verão é protetor solar e olhe lá. Mas dizem que mulher não sua. Chora pelos poros.

A vontade é de sair trajando uma toalha de banho. A vontade é de sair trajando coisíssima alguma. A vontade é de nem sair.

Isso sem falar que, nessa indigníssima estação, os chatos, assim como os mosquitos, se proliferam epidemicamente. Há sempre aquele grupinho da praia, que bate palma pro sol, que endeusa o bronzeado, que bate bola na areia. E que vai morrer de câncer de pele.

Mas não se desesperem, há duas possibilidades de sobrevivência no verão: um carro anfíbio para sair de casa sem contato com sol e chuva; se trancar em casa no aconchego do ar condicionado e lidar com as contas astronômicas de energia, saindo do abrigo apenas nas estações posteriores.

No mais, o verão é uma experiência de quase morte. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2011


                Aniversário de 18 anos tem gosto de remédio. Daqueles remédios amargos, que você prefere morrer lentamente a tomar. Mas é assim, a gastrite nervosa não respeita datas comemorativas.

                Por pura ironia, nasci no dia dos mortos.  De certo eu já sabia como as coisas seriam (um desastre), tiraram-me do útero a ferro.  Nasci aos 9 meses completos de gestação, apesar de todos acreditarem ser o sétimo mês. Não tinha roupas, era feriado, improviso.

                Aprendi a andar cedo. Aprendi a falar bem cedo também. A ficar quieta, pelo menos quando devo, tem sido um aprendizado difícil.

                Com cinco anos já havia lido todos os livros da casa e rabiscado em cada papel possível (e em algumas paredes também). Aos seis anos descobri a escola.  Aos sete anos escrevia pequenas histórias. Aos oito, sofri bullying, antes mesmo de conhecer a palavra. Aos nove fui dada como superdotada.  Aos dez mudei de escola, descobri que Deus não existe e que eu tinha talento para mentir. Logo depois descobri que as outras pessoas compartilhavam do mesmo talento. Aos onze, descobri que minha carta de Hogwarts não viria. Sem Hogwarts, sem poderes mutantes, sem guarda-roupa pra Nárnia. Bah, fim das expectativas, começo do inferno na terra.

                Demorei tempos para aprender a esperar, a não morrer de ansiedade, a apaziguar as lutas constantes do meu cérebro e sistema nervoso versus estômago.

                Tentei aprender a lidar com as pessoas. Frustrei-me.

                Tentei acreditar em Deus. Os 160 pontos de QI daquela criança dada como superdotada não deixaram. Frustrei-me outra vez.

                Tentei ser muito boa em alguma coisa. Continuo me frustrando.


                (Agora fica a saudade do tempo em que aniversário tinha gosto de brigadeiro.)

terça-feira, 1 de novembro de 2011


Eu queria fazer uma viagem de trem. Eu queria completar minha coleção de bonecos da Marvel. Eu queria uma máquina de café espresso em casa. Eu queria uma camisa xadrez de cada cor. Eu queria todos os livros do Saramago. Eu queria saber falar mais línguas que o Papa. Eu queria parar de falar sozinha.

Eu queria morar na Toscana, numa casinha de pedras, estilo medieval, ao lado de um vinhedo. Eu queria ter zerado o Tomb Raider. Eu queria assistir mais filmes. Eu queria minha infância de volta. Eu queria fazer uma descoberta.

Eu queria ter uma memória boa. Eu queria ter lembranças boas. Eu queria que as pessoas se explodissem.  Eu queria explodir as pessoas. Eu queria parar de me importar com as pessoas.  Eu queria que as coisas fossem mais fáceis. 

Eu queria não me deprimir com versinhos tristes, conversas tristes, pessoas tristes. Eu queria uma biblioteca, com uma lareira, e companhia. Eu queria saber desenhar. Eu queria contar histórias felizes. Eu queria saber o nome daquela música em minha cabeça.  Eu queria ganhar logo meus super poderes. Eu queria saber o nome de cada estrela.

Eu queria um piano. Eu queria dinheiro suficiente pra não ter de fazer mais nada pro resto da vida. Eu queria que as pessoas parassem de falar sobre O Homem Invisível e começassem a resolver seus problemas por si mesmas. Eu queria que o meu cérebro funcionasse direito. 

Eu queria parar de lamentar pelas coisas que não tive.
Eu queria escrever coisas que fizessem sentido.
Eu queria ganhar presentes. Mas não queria fazer 18 anos.