sábado, 29 de outubro de 2011

Cogito, uma desgraça.



                Cogito, ergo sum. Cogito, ergo minha vida será um tormento. Se “a ignorância é uma benção”, pensar é o caminho pra loucura.
                Eu poderia divagar infinitamente sobre as verdades contidas nessa frase; em quanto benção tem a ver com ignorância. Mas a intenção aqui é outra.
                Sempre me disseram que para as coisas serem boas, você tinha que as ter moderadamente.  Café de menos te deixa sonolento, café demais não te deixa dormir. Vai ver que pensar é assim também. Pensar de menos te deixa comum, pensar demais faz com que você se afaste de todos os comuns que pensam de menos. Comuns são felizes, pensadores não.
                Pensar demais te faz ver que a realidade é trágica, insignificante, por mais que tragédias sejam significativas, todo sofrimento significa nada. Porque todo sofrimento só existe enquanto se pensa. Pensamentos são transitórios, pessoas são transitórias, a existência é transitória. Talvez esse seja um conceito complexo, talvez pensar sobre isso seja tão inútil quanto não pensar.
                Pensar demais acaba com a vida, justamente porque pensar é o contrário de viver. Pensar te faz parar de acreditar, te faz parar de sentir. Pensar te faz criar preocupações que não existem, para que definhe procurando resolver o que só existe em seus pensamentos. Pensar te faz viver menos. Lembrar que viver é transitório te faz pensar mais. É um ciclo, e enlouquece.
                Buda disse que somos o que pensamos. Tudo o que somos surge com nossos pensamentos. Com nossos pensamentos, fazemos o nosso mundo. Só esqueceu de acrescentar: com os nossos pensamentos, definhamos. Até morrer. 

Maldita imaginação


                Sempre que ouço falar sobre criaturas que se rebelam contra o criador eu penso, automaticamente, na minha imaginação. Ela sempre teve grandes poderes, desde me proporcionar a incrível habilidade de ver carinhas em tudo que existe até me torturar com a criação de infinitas possibilidades paralelas desastrosas. É um inferno na minha cabeça.
                Tudo que ela precisa pra me derrubar são dois segundos de distração.  15 minutos numa sala de espera, por exemplo, é tempo suficiente pra que eu já tenha visto o universo acabando três vezes, pelo menos. Ela não precisa de mais de 5 minutos pra me mostrar como todos os objetos no ambiente são armas letais em potencial para aniquilar metade da fila à frente.
                Uma simples descrição dá à minha imaginação a capacidade de transformar tudo numa produção cinematográfica. Parece divertido, mas não é. Principalmente quando seu cérebro quer te sabotar, quando seus pensamentos são niilistas, quando as pessoas ao redor só contribuem para a sua misantropia.
                Quando criança, minha imaginação me deu de presente um amigo imaginário. Ele andava num dinossauro vermelho e era um assassino. Não que eu fosse uma criança ruim, mas ter alguém pra esfaquear, virtualmente, seus inimigos adultos é sempre útil.  
                Não acho que a minha imaginação, durante a infância, fosse melhor que a atual. Pelo contrário. Acumular vivências dá a imaginação um poder ainda maior. A vantagem de ser criança é poder executar sua imaginação livremente sem parar no analista, ou ser apontado na rua.  Poder dar aqueles ataques de risadas infinitos, com direito a dor de barriga, em público.
                Lembro-me dos reinos e dos super poderes que tinha. Lembro das histórias que eu escrevia e jurava que eram verdade, lembro-me de ter me pintado de verde pra provar à minha mãe que era um alienígena. Lembro-me que ela era maluca e disse que me ajudava a consertar minha nave se eu juntasse os brinquedos, lembro-me que por isso nunca voltei pra casa.

Inferno sensorial


É aquele tipo de dia em que nada faz sentido. O café não tem mais gosto, os pensamentos são desconectos, as pessoas falam outra língua. Os sentimentos estão abafados, seu cérebro não funciona. E continua chovendo.

É aquele tipo de dia em que a respiração fica pesada, as idéias confusas, e as certezas incertas. A chuva continua caindo, as palavras fogem e as objetos perdem a forma.

É aquele tipo de dia em que você não lembra quem é, não reconhece mais seu rosto e as horas não passam. Nesses dias, pensar enlouquece, o tempo se arrasta, e continua chovendo.

É aquele tipo de dia em que dá vontade de chorar. E continua chovendo.

Ewige Wiederkunft

Ewige Wiederkunft, em português, eterno retorno. Eis o conceito de Nietzsche para o eterno retorno, eis o conceito de Nietzsche pro vazio a que tudo pertence: 



"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, poeirinha da poeira!". Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderías: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!" Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: "Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?" pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?"